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Foto do escritorJuliana Tokita

O DESPERTAR DA MULHER SELVAGEM - narrativa em primeira pessoa


Hoje é um dia simbólico para mim.

Há um ano eu sangrava por dentro, fechava um ciclo, tomava uma das decisões mais difíceis da minha vida.

Hoje faz um ano que terminei uma história linda de amor que durou 12 anos.

Mas não estou escrevendo essas linhas para relatar desse episódio em específico. No entanto, ele é importante para o propósito desta narrativa que hoje, finalmente, se inicia neste blog.

O despertar da mulher selvagem.

Quando falamos em despertar, entende-se, primeiramente, que se trata de um processo, por isso, o uso do verbo “despertar”.

Então pensemos sobre isso. Semanticamente: despertar = acordar = desadormecer = surgir.

São termos que sugerem movimento, progressão, etapas. E é exatamente isso o que significa reconhecer a mulher selvagem que existe dentro de cada uma de nós.

No livro da Clarissa Pinkola Estés, Mulheres que correm com os Lobos (1994), ela define logo na introdução do livro o que é a “mulher selvagem”. Não se trata de uma bruxa, descabelada, louca, maligna, que vive escondida no meio da floresta (esta parte talvez seja verdade, mas voltaremos nela em breve), tramando planos e preparando poções e vodus. Essa é a imagem assustadora que a sociedade machista e patriarcal criou para se proteger e nos afastar da nossa alma essencial feminina. Estés narra de maneira belíssima como o chamado da mulher selvagem vai se manifestando dentro da gente. Ela é a nossa voz da intuição, aquela que indica os caminhos, por mais malucos, obscuros ou doloridos que eles pareçam, mas que você sabe que deve seguir.

O problema é que nosso mundo e nossa sociedade nos ensinaram a criticar e silenciar essa voz. Quando, por vezes, no meio da madrugada, você escuta seus sussurros em sonhos noturnos e desperta assustada, dizendo para si mesma que foi só um sonho, você está abafando a sabedoria feminina que jaz dentro da sua alma. De repente, nem mais a escutamos. Deixamos para lá e seguimos perambulando, trombando e tropeçando nos mesmos erros.

Aprender a dar atenção à nossa intuição é o primeiro passo para o desadormecer da sua essência vital.

Para mim foi um processo.

Eu vivi um relacionamento de violência psicológica (mais sobre isso nos próximos posts) bem no início da minha jornada como mulher adulta. Foi terrível e tranquei minhas emoções durante um bom tempo na minha caixinha de pandora. Mas de vez em quando eu a abria e de lá saíam monstros e sombras, sofrimentos e mágoas que eu não estava pronta para lidar. O “acordar”, então, foi surgindo em outras áreas.

Conseguir entrar no curso que escolhi em uma universidade pública me deu uma sensação extremamente prazerosa de poder. Não um “poder sobre”, mas o “poder de”. O poder de conseguir alcançar os objetivos que eu traçava para mim.

Eu sempre trabalhei, desde o cursinho e do jeito que dava... fazia trufas, pão-de-mel, dava aulas aqui e ali... Isso eu agradecerei eternamente aos meus pais que sempre me disseram que eu deveria ser independente financeiramente. E, sim, esse é um outro tipo de poder que a mulher deve sempre buscar.

Virginia Woolf já defendia essa ideia em “Um teto todo seu” (1929). Na obra, ela defende que “uma mulher deve ter dinheiro e um teto todo seu se quiser escrever ficção”. No trecho, ela defende a profissão de escritora, já que se depara com inúmeros homens escrevendo sobre um tema que eles pouco conhecem: a mulher. Mas o que Woolf está aqui defendendo é a liberdade econômica feminina e que só assim é possível para as mulheres conquistarem seus sonhos e exercerem suas habilidades naturais, sejam elas quais forem.

Voltando ao meu processo de desacordar intelectual-financeiro-emocional...

Logo em seguida, dali 3 anos, fui aprovada num processo seletivo de intercâmbio e fui morar um semestre nos E.U.A. Essa experiência mudou a minha vida completamente. Principalmente porque havia uma pressão, por conta da bolsa, de retornar com notas “A” (ou 10) em TODAS as disciplinas. Eu não sabia se conseguiria, mas eu tentei. Tentei com todas as forças do meu cérebro. E consegui.

Aquilo era a sensação mais pura de poder e de empoderamento.

Depois veio a aprovação no mestrado.

Mais adrenalina. Mais sofrimento (SOFRIMENTO EM CAIXA ALTA!) e muito, mas muito crescimento.

Só se cresce assim não é Brasil?

Na dor.

Pois bem.

No mestrado, minha pesquisa era sobre “empowerment”, veja só “empoderamento”. Não sei ao certo como escolhi ou decidi escrever sobre isso. Não foi uma escolha consciente. Mas era, sim, hoje olhando para trás, um chamado da minha voz da intuição, da minha mulher selvagem me dizendo: vai por aqui, por ali.

E eu só fui.

Quando começamos a dar importância para nossa intuição os caminhos começam a se abrir.

Então as coisas foram acontecendo.

Neste processo me divorciei, encontrei uma pessoa incrível que me ajudou demais a me reconhecer. Me conectei com homens e mulheres maravilosxs no decorrer da caminhada – isso acontece até hoje e espero que nunca pare (porque eu AMO!).

Comecei a trabalhar muitão em escolas sensacionais, me exauri de trabalhar, estressei, viajei, relaxei, chorei, ri. Cresci.

Me separei novamente, há um ano. Só que a minha evolução, todo sofrimento e enfrentamento me deram maturidade para tomar decisões assertivas. Hoje sei que foi a melhor escolha. Mas só consegui ouvindo a voz da minha alma. Afinal, a mulher selvagem também é a força da vida-morte-vida. Saber deixar morrer certas coisas, entender que aquilo já teve seu tempo e acabou. Assim, dar espaço para o renascimento do novo.

Hoje sei que tudo isso foi possível porque deixei aflorar a mulher selvagem que estava adormecida dentro de mim. Ela me veio quando fui percebendo que eu era realmente capaz de lutar pelos meus sonhos, mas também por meio da conexão com outras mulheres.

Ouvir outras histórias e outros pontos de vista, sem pré-julgamentos. Ser ouvida, também, me fez perceber como somos parecidas e, ao mesmo tempo diferentes. Mas essa união com outras mulheres, em exercícios quase terapêuticos de, somente, falar o que eu sentia e sobre o que eu vivia, me fez perceber que está tudo bem. Eu posso ser assim. Ou não. Mas eu posso escolher. Não preciso ser escolhida. EU desenho a minha narrativa. EU posso dizer não sem medo – esse é um tipo de poder porreta, hein!

Além disso, e finalmente, me amar do jeitinho que eu sou.

NÃO É FÁCIL.

Mas é forte.

É um exercício diário.

Mas um dia, de repente, você se enxerga livre, intensa, bonita, forte, capaz, irradiando luz e iluminando caminho de outras pessoas.

A sensação é maluca!

Tem pessoas que não irão gostar da mulher selvagem que brota em você: já te aviso!

Mas essas são boas da gente deixar para trás.

Como diz Estés em “Ciranda das mulheres sábias” (2007) “se necessário for, que nos transformemos em alegres subversivas que estão em constante crescimento e têm um coração luminoso e calmo. Assim, chega o espírito à superfície do lago”.

Desejo que, através da minha história, outras mulheres possam deixar aflorar a velha e a jovem que existem dentro de vocês. Pois a sabedoria é essa também: “ser velha enquanto jovem e jovem enquanto velha”. Que vocês escutem à voz da intuição. Que sejamos “alegres subversivas”. Que reconheçamos nosso poder.

Finalizo este (loooongo) post com mais um trecho da Clarissa P. Estés quando ela diz que “osso a osso, fio a fio de cabelo, a mulher selvagem vem voltando. Através de sonhos noturnos, de acontecimentos mal compreendidos e parcialmente esquecidos, a mulher selvagem vem chegando” (...). “ Portanto, se você for introvertida ou extrovertida, uma mulher que ama as mulheres, uma mulher que ama os homens, uma mulher que ama a Deus ou todas as opções anteriores; se você possui um coração singelo ou as ambições de uma amazona; se você está querendo chegar ao topo, ou apenas levar a vida um dia após o outro; se você é animada ou triste, majestosa ou vulgar – a mulher selvagem lhe pertence. Ela pertence a todas as mulheres”.

Que tomemos o que é nosso por direito!

Que resgatemos a nossa alma e a nossa origem feminina!

Que deixemos a mulher selvagem emergir à tona e vicejar em luz, irradiando de luz todos os seres!

Que assim seja!

PS: Sorry pelo post eterno, no próximo vou tentar definir, de acordo com Estés, o que é a mulher selvagem. Mas neste, me ative ao sentido da palavra “despertar”. Beijos de luz!




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